terça-feira, 13 de novembro de 2012

DAR O PEIXE OU ENSINAR A PESCAR?

A questão proposta pelo velho ditado "dar o peixe ou ensinar a pescar?" nunca esteve tão em alta no Brasil como nos últimos tempos. Com um enorme potencial de água disponível, 12% da água doce do planeta e um litoral de mais de 8 mil quilômetros, é possível criar com fartura, de forma controlada, peixes, crustáceos (camarões etc.), moluscos (mexilhões, ostras, vieiras etc.) e algas, entre outros seres vivos.
 
Mercado é o que não falta. O consumo de pescado está em alta no mundo inteiro. O pescado é um alimento saudável e cada vez mais procurado pela população, em todas as faixas de renda. Já as algas são um bom exemplo da diversidade de aplicação dos produtos e subprodutos do setor aquícola. Elas são empregadas desde na alimentação à fabricação de produtos cosméticos e fármacos.
 
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda o consumo anual de pescado de pelo menos 12 quilos por habitante/ano. O brasileiro ainda consome abaixo disso.
 
Entretanto, houve um crescimento de 6,46 kg para 9,03 kg por habitante/ano entre 2003 e 2009. O programa “Mais Pesca e Aquicultura”, do Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA), previa o consumo de 9 kg por habitante/ano apenas em 2011. Portanto, esta meta foi atingida com dois anos de antecedência.
 
A previsão é de que até 2030 a demanda internacional de pescado aumente em mais 100 milhões de toneladas por ano, de acordo com a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). A produção mundial hoje é da ordem de 126 milhões de toneladas. O Brasil é um dos poucos países que tem condições de atender à crescente demanda mundial por produtos de origem pesqueira, sobretudo por meio da aquicultura.
 

Segundo a FAO, o Brasil poderá se tornar um dos maiores produtores do mundo até 2030, ano em que a produção pesqueira nacional teria condições de atingir 20 milhões de toneladas. A VILA DIAS está de olho na possíbildiade de formar uma COOPERATIVA  para a TILAPICULTURA no SUL DE MINAS. E o CHEFE DA VILA já pensa em diversificar os pratos desse peixe para estimular o seu consumo que, além de muito saudável, pode ser uma delícia. Olha só esse filé de tilapia com molho de amoras e cachaça, acompanhado de spaghetti de legumes e shitake grelhado. Hummmm...


 

     

domingo, 11 de novembro de 2012

SERÁ QUE DÁ PARA ACABAR COM A FOME NO MUNDO?

Pessoalmente, acredito que caminhamos para um tempo no qual, dispondo de tanta tecnologia e inteligência como dispomos, a fome poderá facilmente ser extinta do mundo. Por outro lado, há tantos interesses políticos em jogo, tantos interesses econômicos dos mesmos grupos sociais de sempre, que me envergonha, como ser humano, a foto com a qual JOSÉ DE SOUZA MARTINS ilustrou seu artigo, APETITES MANIQUEÍSTAS, abaixo reproduzido. "O menino e o abutre", foto de KEVIN KARTER, lembrou-me uma passagem de Vidas Secas, de GRACILIANO RAMOS. No romance da década de 30, o pai, Fabiano, um migrante sertanejo que foge com a família da fome e da seca nordeste, fica em dúvida se abandona o filho mais novo aos urubus ou se o carrega no colo. Vence o amor e o pai carrega a criança. A foto de Karter é mais crua, o menino do Sudão está sozinho e o abutre espera ao seu lado. Mais de 60 anos separam a denúncia do escritor brasileiro de 30 da denúncia dessa foto, Prêmio Pulitzer em 1993 e, no entanto, o tema ainda é atual. Em 1930 acreditava-se que o futuro traria novas tecnologias que possibitariam acabar com a fome no mundo todo. Esqueceram de dizer que seria possível, sim, se houvesse VONTADE POLÍTICA E ECONÔMICA. Afinal, as novas tecnologias estão aí, há muito tirando dinheiro do bolso do povo tolo com celulares e redes computacionais a custos superfaturados e serviços ineficientes, enquanto a fome parece não ter retrocedido muito. Decididamente, não é uma questão de tecnologia, nem portanto de endeusar o agronegócio, mas, antes, uma questão de ética. Se tem um tema sobre o qual devemos nós, o povo, nos voltarmos nos tempos futuros é sobre a ÉTICA. Ética de mercado, ética política, ética na produção de alimentos, bens e serviços, ética econômica, ética da gestão da coisa pública, ética digital, médica, entre tantas outras. Também a nossa ética de cada dia, a do bom cidadão, honesto e participante, que infelizmente o cauto povo confunde muito com moral, moralismo, personalismo, politiquismo, reacionarismo. Nunca foi tão fácil adquirir conhecimento como nos últimos tempos com a revolução das redes sociais, nunca tão fácil mobilizar grupos; entretanto, nunca se viu um tempo de gente tão estupidificada. Estude, entenda o mundo que o cerca, tenha vontade de ação, aja, pode ser um mínimo gesto, mas temos a nosso favor o fato incontestável de sermos muitos, enquanto eles são poucos. Mas quem eles são mesmo? Essa a questão!

APETITES MANIQUEÍSTAS

Na perspectiva maniqueísta que domina hoje as formas vulgares do pensamento social existe a fome da esquerda e existe a fome da direita. Na esquerda, a fome se mata com reforma agrária e preservação de costumes agrícolas tradicionais das populações camponesas, verdadeiro capital cultural que a Revolução Verde jogou no lixo. Na direita, a fome se mata com o agronegócio, a concentração da propriedade e a modernização tecnológica da agricultura em grande escala, substituindo trabalhador por máquina, fertilizante e agrotóxico.
 
Na esquerda, a agricultura familiar mata a fome dos famintos. Na direita, a agricultura extensa mata antes a fome do mercado. É possível estender a ladainha por um grande número de itens comparativos sem saciar a fome política de nenhum dos dois grupos nem, principalmente, fazer com que o pão nosso de cada dia chegue de fato ao prato raso dos famélicos da terra.
 
A polarização retornou à pauta dos assuntos pendentes no correr dessa semana. O MST, e o grupo de entidades que em torno dele se articula, soltou um manifesto em que questiona, com indignação e medo, dizem, artigo publicado no Wall Street Journal por José Graziano da Silva (o brasileiro que é diretor-geral da FAO – Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação) e Suma Chakrabarti (o indiano que é presidente do Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento).
 
O artigo tem o título provocativo de Fome por Investimento e o subtítulo, mais provocativo ainda, de O Setor Privado Pode Dirigir o Desenvolvimento Agrícola em Países que mais o Necessitam. Provocativo para quem vê o assunto da perspectiva do calor úmido de um barraco de acampamento de sem-terra, mas que de fato não lê o Wall Street Journal senão através de intermediários que não passam necessariamente fome. No entanto, desafiador e instigante para quem vê o assunto com óculos de cifrões no conforto de um escritório bem mobiliado e ar condicionado de Wall Street.
 
Quem lê o manifesto do MST tem a impressão de que, em Roma, o petista José Graziano não tem outra coisa a fazer senão maquinar a demolição das propostas ideológicas da entidade que o julgava amigo, o que ele é. Quem lê o artigo publicado no jornal das altas finanças internacionais tem a impressão de que o intuito de seus autores é bem outro: o interlocutor não é o MST nem o MST está nos horizontes de quem publica artigo nas páginas especializadas em economia do Wall Street Journal.
 
A comparação entre os dois documentos mostra claramente que Graziano e Chakrabarti falam de uma coisa e o MST fala de outra. O medo do MST é a subjacente doutrina do favorecimento do agronegócio na ocupação das terras agrícolas do mundo. O medo de Graziano e Chakrabarti é o de que as urgências das crises internacionais, provocadas pelo capital especulativo, minimizem ainda mais a FAO e seu já claudicante papel no desenvolvimento econômico. Se há tensão política nas crises tópicas recentes na Europa, há também tensão política na crise crônica das populações agrícolas, em especial no Terceiro Mundo.
 
 
 
A terceira via de Graziano e Chakrabarti é, sem dúvida, a de atrair o grande capital para a agricultura nos países que dispõem de extensos territórios férteis em desuso ou usados em cultivos arcaicos e ineficientes. O apelo dos dois autores, tendo em conta os poderes que representam, se baseia no primado da produtividade lucrativa. Por essa via, haveria produção, exportação, emprego. Haveria, também, melhora nas condições de vida dos agricultores. Como tudo que se orienta para a terceira via, o artigo é confuso e escamoteia questões essenciais.
 
A camisa de 11 varas de Graziano já ficara exposta na entrevista que deu à revista alemã Der Spiegel, em 16 de janeiro. Acossado pelas jornalistas, que trataram com sarcasmo suas ideias para resolver o problema da fome no mundo, confrontando-as com as objeções do agronegócio, reconheceu que o problema da fome muito deve à interferência especulativa do capital financeiro no comércio de commodities.
 
Tanto no documento do MST quanto no artigo de Graziano e Chakrabarti a disputa é quanto à propriedade dos meios de produção na agricultura: a família agrícola ou o agronegócio. A fome é aí uma fome puramente teórica. É, pois, na mesma lógica econômica que das incongruências do artigo de Graziano e Chakrabarti se dá conta o MST, quando questiona: “Não mencionam em momento algum que as cifras oficiais mostram que nos três países mencionados (Rússia, Ucrânia e Casaquistão) a produtividade é muito mais alta nas terras em mãos de camponeses que naquelas em mãos do agronegócio”.
 
Portanto, os verdadeiros personagens do triunfo agrícola não são os mencionados e cortejados pelos autores do artigo. Mas se poderia dizer, também, que a fome que os preocupa e preocupa o MST não é a mesma daquela menininha sudanesa, faminta, fotografada em 1993 por Kevin Karter (Prêmio Pulitzer), enquanto um abutre ao seu lado esperava o momento de saciar a própria fome.
* José de Souza Martins é sociólogo, professor emérito da Faculdade de Filosofia da USP. Artigo publicado no jornal O Estado de São Paulo de domingo (23).